
De satélites em órbita a vermes microscópicos, a revolução verde brasileira acontece em silêncio — e com precisão científica. A cada hectare plantado, o país consolida um modelo de produção que alia tecnologia, sustentabilidade e desenvolvimento econômico. Das serras frias do Paraná ao litoral quente de Alagoas, as florestas plantadas — sobretudo de eucalipto e pinus — deixam de ser apenas fonte de madeira para se tornarem símbolo de uma nova economia de baixo carbono.
No Paraná, estado que concentra quase metade da área nacional de plantios florestais, a Associação Paranaense de Empresas de Base Florestal (Apre) sustenta, há mais de cinco décadas, o diálogo entre o setor produtivo, a ciência e o meio ambiente. Com sede em Curitiba, a Apre representa empresas responsáveis por 45% da área de florestas plantadas do estado e integra universidades e centros de pesquisa que dão base técnica às decisões do setor.
“Nosso papel é congregar e representar um setor que trabalha com o futuro. Cada árvore plantada hoje é uma promessa de equilíbrio ambiental e desenvolvimento sustentável”, explicou Ailson Loper, engenheiro florestal e diretor executivo da Apre.

Tecnologia como aliada da floresta
Para José Totti, engenheiro florestal com trajetória em entidades nacionais e ex-vice-presidente da Apre, a inovação é o grande divisor de águas da silvicultura moderna. “As startups e as tecnologias embarcadas vêm mudando a forma como monitoramos e cuidamos das florestas. Hoje, é possível acompanhar em tempo real o que acontece em cada talhão”, observa.
Ele explica que as imagens de satélite permitem identificar estágios de matocompetição, invasões e focos de doenças. “Além disso, conseguimos estimar o volume de biomassa e o estoque de carbono com grande precisão. Já os radares ajudam a avaliar a umidade do solo e o crescimento das árvores”, detalha.

O especialista cita ainda o uso de drones equipados com sensores Lidar [em inglês, Light ou Laser Detection and Ranging - sistema de medição e detecção de objetos através de lasers], que captam o relevo do terreno e o perfil do solo. “Essas ferramentas tornaram o manejo mais eficiente e acessível. Com um drone, o pequeno produtor pode mapear sua floresta com a mesma tecnologia que uma grande empresa usa”, destacou.
Totti também ressalta o avanço de sistemas automatizados. “Hoje temos sensores que controlam tratores e robôs capazes de realizar atividades de monitoramento e controle. Tudo isso reduz desperdício, melhora o rendimento e protege o meio ambiente. A tecnologia é, sem dúvida, o elo entre produtividade e sustentabilidade”, afirmou.
'A tecnologia é, sem dúvida, o elo entre produtividade e sustentabilidade' - José Totti, engenheiro florestal.

Ciência aplicada: o controle biológico da vespa-da-madeira
A engenheira florestal Suzete Penteado, pesquisadora da Embrapa Florestas, é uma das principais referências mundiais em manejo integrado de pragas. Ela liderou o desenvolvimento do Nematec®, produto biológico que utiliza o nematoide Deladenus siricidicola para controlar a vespa-da-madeira (Sirex noctilio), uma das pragas mais destrutivas em plantações de Pinus spp.
“Esse nematoide é um verme microscópico, mas com um poder imenso. Ele esteriliza as fêmeas da vespa e impede que novas gerações da praga surjam. É um controle natural, que preserva a floresta e o equilíbrio biológico”, explica Suzete.

A pesquisadora lembra que o impacto econômico é expressivo. “O controle biológico com o Nematec evitou perdas de até R$ 446 milhões nos plantios de pinus. E, diferente dos químicos, o nematoide se espalha naturalmente e mantém o controle a longo prazo”, ressalta.
Ela reforça que o monitoramento é fundamental: “um plantio bem manejado é pouco atacado. Árvores estressadas atraem a vespa, por isso o cuidado com o solo e o manejo correto são as melhores formas de prevenção.”

Com as mudanças climáticas, alerta, os desafios aumentam. “O regime de chuvas e os períodos de seca têm afetado o equilíbrio dos plantios. Árvores estressadas são mais vulneráveis a pragas, então o monitoramento e a prevenção terão que ser intensificados nos próximos anos”, afirma.
“O futuro do manejo florestal será cada vez mais integrado: pesquisa, tecnologia e campo trabalhando juntos. Essa é a chave da sustentabilidade”, conclui.

A experiência de Alagoas: florestas que movem a economia e regeneram o solo
- Do Sul industrializado ao Nordeste que desponta na economia verde, Alagoas se tornou exemplo de como a silvicultura pode transformar realidades socioambientais.
- Em apenas três anos, o estado ampliou em 10 mil hectares a área de florestas plantadas, alcançando 42 mil hectares — avanço registrado no Especial Eucalipto.
- A produtividade local supera 60 m³ por hectare ao ano, contra 39 m³ da média nacional. Cada hectare de eucalipto pode capturar entre 70 e 140 toneladas de CO₂ durante o ciclo da cultura.
“A silvicultura é um dos pilares do Plano ABC+ Alagoas, que busca uma agricultura de baixo carbono. Estamos unindo produção e conservação, com sistemas integrados e uso racional do solo”, afirmou Aline Rodrigues, a então secretária de Estado da Agricultura e Pecuária.
Ela projetou um crescimento ainda maior: “nossa meta é chegar a 60 mil hectares até 2030. É uma expansão planejada, feita com base em licenciamento, tecnologia e responsabilidade ambiental”.

O engenheiro florestal Ailson Loper, também professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), explica que o modelo praticado hoje é de silvicultura de precisão.
“Temos informações climáticas, do solo, de pragas e produtividade, tudo monitorado por sensores. Isso garante eficiência e sustentabilidade. A madeira é uma fonte renovável e está presente em produtos que nem imaginamos — de tecidos a cosméticos. A floresta está mais perto do nosso dia a dia do que parece”, afirmou.
Monitoramento e regulação: a visão dos órgãos ambientais
A expansão das florestas plantadas exige uma base sólida de fiscalização e licenciamento ambiental. O Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA/AL) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) reforçam que o crescimento deve ocorrer de forma controlada e em harmonia com os biomas locais.
“As florestas comerciais não competem com as vegetações nativas. Pelo contrário: reduzem a pressão sobre elas ao oferecer alternativas econômicas sustentáveis”, defendeu Rivaldo Couto, superintendente do Ibama em Alagoas.

Segundo Couto, o órgão atua em conjunto com os estados e produtores para garantir que a silvicultura siga padrões ambientais rígidos.
“O equilíbrio está em conciliar a expansão produtiva com a preservação. A madeira de floresta plantada substitui a exploração irregular e ajuda a regenerar áreas antes degradadas. É uma mudança de paradigma”, afirmou.
O gerente de Fauna e Flora do IMA/AL, Henrique Lessa, complementa que o órgão tem intensificado o uso de tecnologias de georreferenciamento e imagens de satélite.
“Monitoramos o avanço da silvicultura por meio de plataformas como o MapBiomas. Assim, conseguimos diferenciar a vegetação nativa das florestas plantadas e entender seus impactos reais. Nosso papel é técnico e preventivo”, explicou.

O IMA/AL utiliza ferramentas como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), o Documento de Origem Florestal (DOF) e o aplicativo ‘IMA Denuncie’, que permite o acompanhamento público das áreas de cultivo. “A participação da sociedade é essencial para a transparência e o controle social da atividade”, ressalta Lessa.
Sustentabilidade como norte
Mais do que madeira, as florestas plantadas representam ciência aplicada ao futuro.
O consultor ambiental Alder Flores define a silvicultura sustentável como “a ponte entre produtividade e preservação”.
“Ela não é só o cultivo de árvores, mas um sistema que conserva recursos hídricos, reduz emissões de carbono e fortalece comunidades rurais. O eucalipto é o símbolo dessa nova fase: ele dá sombra ao gado, protege o solo e gera renda para o produtor”, diz.
Para ele, o Brasil reúne todas as condições para liderar a transição florestal global. “Temos clima, ciência e capacidade produtiva. O que precisamos é continuar garantindo que o crescimento econômico esteja atrelado ao respeito ambiental. E isso já está acontecendo”, avalia.
“O movimento que vemos hoje é promissor. Ao unir conhecimento técnico, boas práticas e empresas comprometidas com o meio ambiente, estados como Alagoas e Paraná mostram que o verde também é o caminho do desenvolvimento”, conclui Flores.
